Ainda um estereótipo de gênero?
O Brasil é o segundo país do
continente americano que implementou uma Política Nacional de Atenção Integral
à Saúde do Homem, lançada em 2009 pelo Ministério da Saúde, e tem por objetivo
facilitar e ampliar o acesso da população masculina aos serviços de saúde, em
resposta à observação de que os agravos do sexo masculino são um problema de
saúde pública em consonância com o fato de que vivem, em média, sete anos menos
do que as mulheres e têm mais doenças do coração, câncer, diabetes, colesterol
e pressão arterial mais elevadas.
Diante dos dados em relação ao
conjunto de casos de varias doenças e os seus agravos à saúde da população
masculina e mais especificamente relativos ao câncer de próstata, entende-se
que essa iniciativa do Ministério da Saúde constitui um marco em relação à
saúde do homem e certamente resultará em avanços significativos nesse sentido.
No Brasil existe uma lei sobre as
ações que sinalizam preocupação com a saúde do homem, Lei 10.289, de 20 de
setembro de 2001, que dispõe sobre a Instituição do Programa Nacional de
Controle do Câncer de Próstata. Nela são estabelecidas, entre outras, as
seguintes ações:
I – campanha
institucional nos meios de comunicação, com mensagens sobre o que é o câncer de
próstata.
III – parcerias com
universidades, sociedades civis organizadas e sindicatos, organizando-se debates
e palestras sobre a doença e as formas de combate e prevenção a ela;
IV – outros atos de
procedimentos lícitos e úteis para a consecução dos objetivos desta instituição
- a qual posteriormente necessitou sofrer alterações para adequar-se a
critérios técnico-científicos.
II – parcerias com
as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, colocando-se à disposição da
população masculina, acima de quarenta anos, exames para a prevenção ao câncer
de próstata.
De acordo com o Instituto Nacional
de Câncer (INCA), órgão do Ministério da Saúde responsável pela prevenção e
controle do câncer no Brasil os tipos mais incidentes, com exceção do câncer de
pele do tipo não melanoma, serão os cânceres de pulmão e de próstata no sexo
masculino. No Brasil, o câncer de próstata é o mais incidente entre os homens,
na Região Centro-Oeste e o mais frequente nas regiões Sul, Sudeste, Nordeste e
Norte.
Fatores que determinam o risco de
desenvolvimento do câncer de próstata também não são bem conhecidos, apesar de
alguns terem sido identificados. Entre eles destacam-se a idade avançada,
origem étnica – maior incidência em negros – e origem hereditária.
Existem agentes potencializadores
ou minimizadores na determinação do risco do câncer de próstata. Dentre os que
possivelmente atuam na diminuição do risco destacam-se uma dieta rica em
frutas, verduras, legumes, vegetais, grãos, cereais integrais e pobre em
gordura, principalmente as de origem animal. Um exemplo sobre isso pode ser
dado através de alguns estudos epidemiológicos apontados de que a doença é dez
vezes mais prevalente em norte-americanos do que em japoneses que residem no
Japão. A prevalência se iguala, quando os japoneses passam a residir nos EUA,
indicando que os fatores ambientais e alimentares contribuem na formação dessas
células cancerígenas. Portanto o tipo de dieta aumenta ou diminui os riscos de
câncer de próstata. Outros fatores como o tabagismo, o etilismo e a vasectomia
também são passíveis de influenciar potencialmente o desenvolvimento do câncer
de próstata.
Nesse sentido, mais estudos estão
em andamento tentando esclarecer o papel dos fatores de risco e seu potencial
para o sucesso na prevenção contra o câncer de próstata. Sabe-se que os fatores
hereditários são importantes na determinação do risco de desenvolver
clinicamente esse tipo de câncer.
A definição ou os conceitos
construídos por partes da sociedade ao longo do tempo de que o homem é um ser
“bruto”, “forte”, “agressivo” enquanto a mulher é mais “meiga”, “delicada”,
“frágil”, “doce” podem influenciar em questões relacionadas à saúde.
Os homens procuram menos os
serviços de saúde e uma das possíveis explicações para isso seria em relação à
preservação de sua masculinidade, enquanto o homem está associado à
invulnerabilidade, força e virilidade. Essas características do homem
mostram-se incompatíveis com a demonstração de fraqueza representada pela
procura aos serviços de saúde, além do que há uma dificuldade do homem muitas
vezes em falar sobre seus problemas de saúde, pois significaria uma fraqueza.
Outra dificuldade exposta pelos
homens, baseada em um estudo, é a incompatibilidade dos horários de
funcionamento dos serviços de saúde com sua carga horária de trabalho além de
muitas vezes quando procuram o atendimento enfrentam filas, perdendo assim um
dia de trabalho, com essa precariedade os participantes do estudo afirmam que
só buscam por atendimento em situações de emergência ou em alguma
impossibilidade de ir ao trabalho.
Outra justificativa é quanto à
exposição do paciente a outro homem ou a uma mulher que também é apontada,
nesses casos o câncer de próstata foi o tema utilizado para tal justificativa,
nos exames é necessário examinar as partes genitais masculinas. Isso afetaria
de alguma maneira a sua integralidade, esse é mais um ponto importante para
entender o porquê os homens procuram menos os serviços de saúde quando
comparado às mulheres.
Vários motivos acarretam aos homens
o surgimento de doenças, entre eles a busca pela "prova da
masculinidade" é comum de encontrar e atinge muitos jovens como, por
exemplo, temos o início da sexualidade que a cada dia inicia mais cedo e quando
não há métodos preventivos pode trazer malefícios como DST e AIDS. Um dos
clássicos eventos da masculinidade no serviço de saúde é o exame preventivo de
Câncer de próstata, pois o exame precisa do toque retal e muitos homens não o
fazem por conta do método ser invasivo.
Um determinante social que também
influencia na realização de exames preventivos é a escolaridade tendo em vista
que muitos homens que tem escolaridade fazem com maior frequência os exames e
na população masculina de baixa escolaridade fazem com menos frequência o exame
de próstata não sendo isto uma regra.
Com relação à prevenção a esse tipo
de câncer com analise do exame de PSA e o exame do toque existem homens que
apresentam certa resistência para a realização desses exames por questões
culturais ou pessoais possibilitando a eles terem um diagnóstico tardio que
dificulta o tratamento da doença e possivelmente acaba sendo vítima da sua própria
masculinidade.
Em relação à dosagem de PSA e toque
retal, tanto foram identificadas recomendações de não se excluir a dosagem de
PSA e o exame do toque digital como medidas de detecção precoce contra o câncer
de próstata, quanto foram identificados documentos que apontam que não há
evidências sobre o sucesso na redução da mortalidade com o rastreamento de
pacientes pela dosagem de marcadores como o PSA e que muitos homens podem estar
sendo conduzidos a cirurgias desnecessárias.
Espaços de atuação da promoção da
saúde do homem podem ser promovidos, inclusive nas situações do cuidado
hospitalar, o que é pertinente na medida em que os homens, diferentemente das
mulheres, procuram os serviços, na maioria das vezes, para atendimentos de
emergência e não de forma determinada e programada para manutenção da saúde.
Outro aspecto importante no que diz
respeito a pacientes com câncer de próstata e o seu tratamento é o apoio
psicológico dado a eles. Quando quimioterapias, prostatectomia radical que
levarão a mudança da qualidade de vida são necessárias, o homem tende a ficar
depressivo e necessita de mais apoio no grupo familiar e social e quando esses
apoios não são suficientes, é aconselhado que ele procurasse um grupo de apoio
para homens com câncer de próstata, para que recebam ajuda com o
compartilhamento de experiências por conhecer e ouvir pessoas que estão na
mesma situação.
Esses grupos auxiliam na adaptação
aos rigores do tratamento, reduzem o estresse e favorecem no incremento da
qualidade de vida. Os participantes que entram em contato com pessoas que
compartilham das mesmas sensações, ajuda na aceitação do tratamento e da doença
e consequentemente uma melhora significativa no quadro clínico, social e
psicológico.
Um dos grandes problemas dos homens
com o câncer de próstata é a fragilidade que sentem em relação à identidade
sexual que é reflexo dos procedimentos realizados no tratamento além do que
esses grupos também podem ser visitados pelas esposas que compartilharão
experiências com outras mulheres. Contudo, a avaliação da melhor forma de
abordagem do grupo deve se redefinir de acordo com as necessidades dos
participantes.
Diante de todos os expostos,
sugere-se que os profissionais da saúde em diferentes espaços de cuidado,
acompanhem os resultados de estudos que apresentem melhores níveis de evidência
em termos de prevenção do câncer de próstata e fatores de risco, o que também
poderá oferecer subsídios de condutas a serem seguidas.
Considera-se necessário também que novas pesquisas sejam
conduzidas na área da promoção da saúde, prevenção do câncer e grupos de apoio
a homens com câncer de próstata bem como que ocorram mudanças na educação
formal da população e no ensino específico dos profissionais da área da saúde,
uma vez que estes podem proporcionar uma melhoria significativa aos programas
de promoção da saúde e prevenção do câncer pelos indivíduos.
Sobre os grupos de apoio a homens
com câncer já se conhece sua importância como forma de tratamento e
reintegração dos indivíduos e servem também para mostrar aos profissionais de
saúde o seu papel significante na iniciativa.
Pensando
nisso, foram feitas algumas entrevistas que tiveram como objetivo observar o
que alguns artigos indicam, ou seja, como é que homens lidam com a sua saúde e
como a sociedade influencia sobre o seu corpo, modo de agir e interação entre
homem e saúde, tanto ela no sentido hospitalar como a do dia-a-dia. Foi quase
uma unanimidade de que homens só procuram uma unidade hospitalar apenas quando
“algo diferente do habitual aconteceu na vida dele” como bem disse a enfermeira
Geise do posto de saúde 4-Ceilândia.
Segue abaixo entrevistas realizada com a população e profissionais da área:
Geise (enfermeira do posto de saúde 4-Ceilândia):
Marcos, 44 anos:
Rauzi Alexandre, 43 anos:
Antônio, 54 anos- vigia do posto de saúde 4 de Ceilândia
Entrevistador (En): "Procura um atendimento médico
frequentemente?"
Antonio (A): "Vou ao hospital pelo menos uma vez no ano, vou
mais quando estou em situação de emergência. Tenho que fazer cheque up de 6 em
6 meses, por causa da hipertensão.”
(En): "Acredita que a masculinidade atrapalha o homem
a procurar os serviços de saúde?"
(A): "A masculinidade atrapalha, o homem é muito dificil
de ir ao médico.”
(En): "Há impedimentos no trabalho, que não permitem
que o senhor procure o serviço de saúde?"
(A): "Eu trabalho dia sim dia não então o trabalho não
atrapalha, não vou por falta de interesse.”
(En): "Têm hábitos saudáveis?"
(A): "Tento manter uma alimentação saudável, mas eu bebo
e fumo.”
(En): "Possui algum plano de saúde?"
(A): "Tenho plano de saúde.”
(En): "Teria alguma crítica ou sugestão para melhorar
a relação do homem com os centros de saúde?"
(A): "A saúde não se interessa pelo problemas do homem,
tem que ter mais programas de saúde para o homem não só para a mulher. Trabalho
aqui no posto há 34 anos e não vejo nenhuma sala própria para o homem apenas
para mulheres.”
Welington Oliveira Costa, 24 anos:
Entrevistador (En): "Olá, Welington.bom dia!"
Welington (W): "Bom dia!"
En: "Então, você como um joven da sociedade
brasileira,alguma vez já pensou no cuidado com a sua saúde? Por exemplo, pela
alimentação ou algo do tipo?
W: Olha, desde que eu larguei a escola para ir
trabalhar, eu levo uma vida corrida. As vezes chego em casa tarde, só tem um
miojo pra comer ali rapidinho, então fica bem difícil comer direito."
En: "E quanto a exercício físico? Você pratica algum?"
W: "Trabalho, não tenho tempo pra isso (rs)"
En: "Mas nem no final de semana?"
W: "Final de semana eu quero descansar, né?
Principalmente porque só tenho uma folga na semana, tenho que aproveitar do
jeito que dá."
En: "Você procura unidades de saúde com frequência?"
W: "Não..."
En: "Nem quando os sintomas são realmente fortes?"
W: "Pra te falar a verdade, só procurei o doutor quando
eu sofri um acidente no ombro, em que eu tive até que botar um pino, aqui ó
(mostrou o pino). Fora isso, eu não vou."
En: "Mas você não vai por que não quer, ou por que
alguma coisa te atrapalha? Por exemplo: trabalho, tempo..."
W: "Ah, vei, eu não vou porque eu já saro sozinho e por
causa que procurar médico pra que, se a gente sempre ve que não tem médico na
televisão."
En: "Você não acha que seria interessante, algum dia,
fazer alguns exames de rotina só pra ver se está tudo em ordem?"
W: "Bem que eu queria, mas não vou gastar minha
folguinha pra isso..."
En: "Mas é só pegar atestado!"
W: "Pois é, quem sabe um dia..."
En: "Então tá ok, sr. Welington, muito obrigado"
W: "De nada."
O senhor Rauzi Alexandre, 43
anos, também abordou o tema falando que “antes da diabetes dificilmente ia ao
médico” mostrando que ações preventivas de saúde nem sempre são valorizadas e
feitas pelos homens no Brasil. À questão do trabalho não é unanime, alguns
falam que o trabalho atrapalha no sentido de que não pode faltar, pois podem se
prejudicar, outros não encontram esse tipo de dificuldade, já que podem sim
faltar por questões de saúde. Recursos também foram citados pelos
entrevistados, em que se chega à unidade de saúde, seja ela no posto ou até
mesmo em uma UPA e o atendimento não é feito pela falta de médico ou de
recursos. A enfermeira Geise, em contrapartida, demonstrou o outro lado da
moeda, de que mesmo que não haja o recurso no dia específico em que a unidade
foi procurada, talvez dali a 15 dias possa ser que o problema tenha sido
solucionado. Outra questão que pode ser ressaltada é a de que o governo tem
programas e campanhas que se fossem bem executadas poderiam facilitar a vida de
todos, mas por falta de recursos e de preparo esse atendimento não chega à
população não se restringindo aos homens, mas a todos os grupos (mulheres,
crianças, idosos...).